Estigma da medicação: desmistificando o uso em pacientes com transtornos alimentares

Ninguém gosta de tomar remédio. Sim, esta é uma queixa bastante comum nos consultórios médicos, e, em particular, nos consultórios psiquiátricos quando se é necessário iniciar um tratamento medicamentoso.

O uso de medicações psicotrópicas – que agem no sistema nervoso central – ainda é cercado de muitas dúvidas: como funcionam os antidepressivos? Os calmantes “tarja-preta” vão me viciar para sempre? E os tais estabilizadores do humor, os antipsicóticos…que medo, vão me engordar?

 

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As principais diretrizes internacionais para o tratamento dos transtornos alimentares recomendam uma combinação de recursos terapêuticos como a psicoterapia, o uso de remédios, o acompanhamento nutricional, o suporte clínico, dentre outras estratégias também relevantes que auxiliam no processo de recuperação clínica, ou seja, o uso de medicação é apenas um dos recursos possíveis.

Quando se prescreve um remédio para tratar anorexia nervosa, bulimia nervosa, transtorno de compulsão alimentar, por exemplo, o foco é ajudar o paciente a enfrentar as alterações de pensamento e de comportamento alimentar que vem causando impacto na sua vida, bem como as chamadas comorbidades (doenças que também surgem com o transtorno alimentar): medo pavoroso de engordar, preocupação incessante com o que come, vomitar frequentemente para compensar um episódio de compulsão, sentir-se sem qualquer controle na hora de se alimentar, ficar deprimida ou extremamente ansiosa, impulsiva…são situações que podem ser parcial ou totalmente melhoradas com o uso de uma medicação bem indicada.

Existe, entretanto, uma particularidade: nos casos de anorexia nervosa, uma característica clássica da paciente é não se considerar doente, e, por este motivo, propor uso de qualquer medicação pode ser entendido como atitude desnecessária ou como “ameaça” pelo “risco de engordar”. Trata-se de um desafio não apenas ao médico, mas para toda a equipe multidisciplinar que precisa ajudar o paciente e sua família nesta situação de recusa de tratamento.

Vale ressaltar que não existe mágica! A construção de uma relação de confiança com o psiquiatra é fundamental para que o paciente possa tirar dúvidas, entender para qual finalidade o remédio está sendo proposto e quais são os efeitos colaterais que se manifestam mais frequentemente para um determinado remédio. Deste modo, a segurança ao tomar a medicação será maior e a caminhada para a recuperação plena será certamente mais breve e bem sucedida.

 

Dr. Marcel Higa Kaio

Médico psiquiatra, graduado pela UFPR, Residência Médica em Psiquiatria pelo Departamento de Psiquiatria/UNIFESP-EPM, Mestre em Ciências pela UNIFESP e ex-coordenador do Proata (2016 – jun/2019).


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